Barbara Gancia - colunista - Folha de São Paulo 06-abr-2007
APOSTO UM picolé de limão que hoje, em São Paulo, milhares de pessoas como eu -sejam elas judias, cristãs, muçulmanas, budistas, descrentes ou praticantes do zoroastrismo- estão se sentindo órfãs do rabino Henry Sobel.
Ao longo dos anos, aprendi a admirar a postura conciliatória do rabino, sua sabedoria e a posição corajosa que tomou na época do regime militar. Henry Sobel sempre foi um orgulho para os habitantes da cidade, uma benção para São Paulo.
Em março de 2000, escrevi uma coluna falando de Israel, para mim o país mais deslumbrante que já conheci, e o rabino retribuiu com um carinhoso bilhete: "Quero apenas que você saiba que aprecio imensamente seus artigos. O de 22 de março, sobre a viagem do papa a Israel, foi divino! Que Deus a abençoe". Até a última sexta-feira, a mensagem estava na minha parede.
Mas, algo terrível se passou com Henry Sobel e, na semana passada, o paulistano descobriu que o líder da comunidade judaica, figura que sempre atuou como baliza moral em situações críticas, foi detido pelo furto de quatro gravatas.
Por tudo que o rabino representa, muitas foram as vozes que se apressaram em perdoar o homem, Henry Sobel. É muito justo que seja assim, e só quem nunca cometeu um tropeço pode condenar toda uma biografia por conta de um gesto isolado.
Acontece que, logo depois do ocorrido, ao ser interpelado a comentar o fato no site de notícias G1, da Globo, Sobel agiu com soberba e negou tudo. Disse, textualmente, quando indagado sobre o furto: "Claro que não é verdade. Estive nos EUA, mas não fui preso". Ainda sem saber que o boletim de ocorrência com sua foto já estava na internet, ele insistiu: "Nada disso é verdade. A notícia é sensacionalista. Não sou eu na foto, garanto. Vou tomar providências".
Depois, surgiu a versão de que ele estaria sofrendo do mal de Parkinson e teria alterado as dosagens dos medicamentos que lhe foram prescritos. E as cartas de membros proeminentes da comunidade prestando solidariedade ao rabino continuaram a chover nas Redações.
Pois algo me diz que as pessoas que perdoaram Henry Sobel com tanta facilidade querem mais é tentar, no fundo do âmago, negar seus próprios defeitos. Ou será que as prisões tapuias não estão coalhadas de pais e mães que furtaram para dar de comer aos filhos?
Por mais que eu simpatize com Sobel, o admire e seja infinitamente agradecida por tudo o que ele já fez, sou obrigada a concordar com a ironia da máxima popular que diz que "pobre quando rouba é ladrão, e rico tem problemas psicológicos". O que o rabino fez é gravíssimo.
Veja só: no caso de Sobel estar tomando algum remédio de embalagem com tarja preta, como é que ele foi ao shopping (em que o furto teria ocorrido) ao volante de um Toyota Avalon? Nas bulas desse tipo de remédio não há um aviso claro de que não se deve dirigir ou mexer com maquinário quando se está sob efeito da medicação? E se, em vez de furtar gravatas de marcas grã-finas (ai, esse materialismo que corrói o espírito!), ele tivesse atropelado uma criança, quem teria se responsabilizado? De fato, caro rabino, "é muito difícil explicar o inexplicável".
sexta-feira, 6 de abril de 2007
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