terça-feira, 10 de abril de 2007

Sobel não pode ser cruxificado

Helio Rubens de Arruda e Miranda (*)

Antes que tentem maldosamente 'explicar' porque estou defendendo o rabino Henry Sobel, quero esclarecer antes de mais anda que não sou judeu. Também não sou daqueles que defendem os famosos e não desculpam os pobres, achando que estes deveriam ir inapelavelmente para a cadeia em casos semelhantes.

Mas acho que, por dever de justiça, é preciso considerar toda a vida pregressa do rabino e só depois tentar entender porque ele entrou numa loja da Louis Vuitton, em Palm Beach e 'roubou' uma gravata.

É importante que o fato policial seja analisado sob a visão da complexidade e não de maneira isolada. Como ensina Edgar Morin, não se deve avaliar nada de forma fragmentada, desconsiderando o conjunto de fatores que levaram ao fato. Muito menos num caso tão notável como esse.

Aplicando esses sábios ensinamentos à situação do rabino Sobel, veremos que não é justo julgá-lo por essa única ação. Independentemente de ponderações sobre se foi uma atitude certa ou errada, fruto de excesso de medicamentos ou ainda por puro desejo de experimentar uma sensação 'diferente' (adrenalina), vamos analisar o contexto.

Durante o maldito regime militar brasileiro alguns nomes se destacaram entre os que combateram a violência governamental. O padre católico dom Paulo Evaristo Arns e o rabino judeu Henry Sobel, como bons pastores que sempre foram, enfrentaram corajosamente, à época, as botas dos militares e acolheram seus fieis em seus templos, amparam-os e os confortaram em suas dores. Com destemor admirável, promoveram cultos religiosos em favor das vítimas da ditadura e incentivaram outros idealistas a combaterem o regime de força.

Não se pode esquecer – e aqueles que não sabiam que fiquem sabendo - que Sobel, mesmo sendo natural dos Estados Unidos, portou-se a vida toda, particularmente durante o regime de exceção, até melhor do que muitos brasileiros natos que, temerosos e ambiciosos, lambiam os militares ditadores de plantão. Sobel realizou dezenas de visitas periódicas, mitigando as dores dos jovens que estavam sendo torturados nas cadeias e nos presídios. E também levou consolo aos pais e amigos daqueles que patrioticamente ofereceram suas próprias vidas para defender a democracia no Brasil.

Foi Henry Sobel quem clamou pelo julgamento dos responsáveis pela morte do jornalista Wladimir Herzog, aparecido morto numa cela e apresentado como tendo se suicidado. Foi ele também que defendeu outros presos políticos, que judeus ou não, estavam presos, submetidos a interrogatórios cruéis e selvagens que incluíam choques nos órgãos sexuais, unhas arranca-das, surras homéricas e até coisas piores, como abusos sexuais de todo tipo.

Não se pode agora, por um simples ato-falho (ou o nome que se dê) jogar no lixo a reputação de um homem que prestou tantos serviços à nação! Não é direito nem sensato condená-lo, até porque o alegado 'roubo' derivou mais um problema psíquico causado provavelmente por excesso de medicação do que de um desvio de conduta moral. Além disso, o passado o redime.

O julgamento de Sobel está marcado para o próximo dia 23 de abril numa corte norte americana. Será que a juíza encarregada do caso considerará que ele foi um lutador exponencial pela democracia no Brasil? Será que ela considerará o contexto da vida dele ou se apegará simplesmente ao BO policial?

Na visão neoliberal – que só considera como valor o dinheiro, o ganho, o lucro - é possível mesmo que o simples ato de furtar uma gravada justifique uma condenação a uma pessoa, mesmo sendo ela valiosa para a humanidade. O capitalismo selvagem dos dias de hoje – que vigora lá nos EUA - mas que é muito pior aqui porque nos submete aos interesses de lá - desconsidera a honra, a coragem, a solidariedade e a responsabilidade social. E faz imperar a máxima do 'ganhar ou ganhar', sem se preocupar com os meios utilizados para se chegar aos objetivos, num total desprezo aos valores éticos, morais ou espirituais (eis aí o exemplo inumano dos programas tipo bigbrother, onde ganhar o prêmio maior é o que importa, mesmo que para isso tenha que abandonar qualquer pudor ou valor!).

Claro que não sei qual vai ser o resultado da corte norte-americana. Mas posso esperar - isso sim! - que a opinião pública brasileira absolva o rabino Henry Sobel e repudie qualquer condenação a ele, reconhecendo assim seus méritos e não o execre, como, aliás, uma parte da imprensa já está fazendo!

(*) o autor é jornalista, editor do jornal eletrônico ROL – Região On LINE, apresentador do programa 'Berlinda' (TVi - canal 21) e membro fundador do Pólo Sorocaba da Aliança Internacional de Jornalistas.

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